segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Carta da Semana #9


14 de janeiro de 1992
Querido amigo,
Estou me sentindo um grande impostor porque deixei toda a minha vida para trás e ninguém sabe disso. É difícil sentar na minha cama e ler como eu sempre fiz. É difícil até falar com meu irmão ao telefone. O time dele terminou em terceiro no nacional. Ninguém contou a ele que nós não vimos o jogo por minha causa.
Fui à biblioteca e procurei por um livro, porque estava assustado. De vez em quando as coisas começam a se mexer novamente e os sons ficam graves e surdos. E eu não consigo colocar os pensamentos em ordem. O livro dizia que às vezes as pessoas tomam LSD e não conseguem sair realmente dele. Ele diz que o LSD aumenta um tipo de transmissor cerebral. Diz que a droga corresponde essencialmente a doze horas de esquizofrenia; se você já tem muito desse transmissor cerebral, não consegue sair dessa.
Comecei a respirar mais rápido na biblioteca. Foi muito ruim, porque me lembrei de algumas crianças esquizofrênicas no hospital quando eu era pequeno. E o pior é que foi um dia depois de eu ter percebido que todos os garotos estavam usando suas roupas novas de Natal, então decidi vestir meu novo terno que Patrick me deu para ir à escola, e caçoaram de mim por nove horas seguidas. Foi um daqueles dias ruins. Matei a primeira aula e fui procurar Sam e Patrick do lado de fora.
― Tá elegante, Charlie ― disse Patrick, sorrindo.
― Pode me dar um cigarro? ― eu disse.
Não conseguia ver a mim mesmo dizendo "filar um cigarro". Não na primeira vez. Eu não consegui.
― Claro ― Patrick respondeu.
Sam o deteve.
― O que foi, Charlie?
Contei a ela o que havia de errado, o que levou Patrick a ficar me perguntando se foi uma "viagem ruim".
― Não, não. Não é isso.
Eu estava ficando bem perturbado.
Sam colocou o braço em torno dos meus ombros e disse que sabia o que tinha acontecido comigo. Disse para eu não me preocupar com isso. Depois que você faz isso, você se lembra de como as coisas se parecem. É só isso. É como uma estrada que fica cheia de curvas. E como seu rosto era de plástico e seus olhos têm tamanhos diferentes. Tudo está na sua cabeça.
Depois disso ela me deu um cigarro.
Não tossi quando traguei. Ele me acalmou. Aprendi que fazia mal em uma aula, mas não era verdade.
― Agora concentre-se na fumaça ― disse Sam.
E eu me concentrei na fumaça.
― Agora parece normal, não é?
― Hum-hum ― Acho que foi o que eu disse.
― Agora olhe para o piso do pátio. Ele está se mexendo?
― Hum-hum.
― Muito bem... Agora concentre-se na folha de papel que está ali no chão.
E eu me concentrei na folha de papel que estava no chão.
― O piso está se movendo agora?
― Não, não está.
A partir de agora, para que você se sinta bem, para que você nunca mais tome ácido de novo, Sam passou a explicar o que ela chamava de "o êxtase". O êxtase acontece quando você não focaliza nada e todo o ambiente desaparece e se move em volta de você. Ela disse que isso era em geral metafórico, mas, para as pessoas que nunca devem tomar ácido, era real.
Foi aí que eu comecei a rir. Estava bastante aliviado. E Sam e Patrick sorriram. Fiquei contente de eles sorrirem também, porque eu não estava suportando a cara de preocupação deles.
As coisas pararam de se mover na maior parte do tempo desde então. Não matei a outra aula. E acho agora que não me sinto como um grande impostor por tentar deixar minha vida para trás. Bill achou meu trabalho sobre O apanhador no campo de centeio (que escrevi em minha nova máquina de escrever antiga!) o melhor que já fiz. Ele disse que eu estava me "desenvolvendo" em um ritmo rápido e me deu um livro diferente como uma "recompensa". É Pé na estrada, de Jack Kerouac.
Agora fumo mais de dez cigarros por dia.
Com amor,
Charlie.

~rod

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